Você sabe o que é um tango? Pela sua vivência, sabe julgá-lo de qualidade ou não como música, dança e aula?
Este artigo tem como objetivo acrescentar à sua visão e sua crítica minha percepção sobre o que leigos pensam sobre o tango.
Certa vez, Ângela, estudante de tango de uma das minhas turmas, veio
me contar sobre suas últimas férias passadas em Buenos Aires. Era sua
primeira vez na cidade e, depois de um ano de aulas de tango, queria uma
imersão completa no mundo portenho. Seguindo as recomendações da
agência de turismo e de alguns parentes que já haviam feito essa viagem,
marcou seu citytour e três jantares com “show típico de
tango”. De volta ao Brasil, em sua primeira aula, fez questão de chegar
mais cedo para me contar que se sentia muito decepcionada com os shows
de tango que havia visto e, também, com sua dança pessoal. Com os shows
porque esperava ver mais danças parecidas com as que ela aprendia, menos
músicas cantadas e muito, mas muito menos cavalos brancos e mulheres
seminuas no palco; consigo mesma, porque depois de ver aqueles shows se
sentia incapaz de aprender a dançar e batia também uma sensação de ter
jogado fora um ano estudando tango.
Existem dois tipos de tango para a maioria dos tangueiros: o tango show e o tango salão.
Porém, essa classificação não corresponde efetivamente à realidade.
Talvez a mais impertinente seja a de “tango show”. Impertinente porque
uma apresentação de tango pode sofrer inúmeras variações de acordo com
os espectadores e, espectadores com “s” são sempre expectadores com “x”
quanto ao número a ser apresentado. Por isso, deve-se ter cuidado com
tal classificação levando-se em consideração também a plateia. Portanto,
o conhecimento e vivência sobre o tango influencia diretamente no gosto
e na valoração do bom e do ruim, do belo e do feio, tanto de quem dança
quanto de quem assiste.
Os consagrados dançarinos de tango Sebastian Arce e Mariana Montes.
Todavia, indiscutível é a coerência da classificação “tango show” na
apresentação dos campeões mundiais de 2012 na categoria “tango
escenario”, Cristian Sosa e María Noel Sciuto. Preencheram todos os
critérios objetivos e subjetivos do regulamento do campeonato que ditam a
expressão dos dançarinos, os figurinos, a escolha da música, as
escolhas de passos de efeito e de uma sequência apoteótica para o grande
final. Em geral esse tipo de show de tango trás em si, não só para o
leigo, mas também para os tangueiros, um elevado índice de sensação de
tango.
Comparando os dois shows de
tango acima citados podemos dizer que um se encaixa mais na
classificação “tango show” do que o outro? Se
respondermos que sim estaremos negando uma, de duas lindas formas de
expressão tangueira. Os dois são belos shows de tango, mas,
particularmente, gosto mais do show do primeiro casal. Questão de gosto e
não de crítica técnica ou artística.
Cristian Sosa e María Noel Sciuto, na performance que lhes garantiu o título de Campeões Mundiais de Tango Escenário 2012.
Não me sinto à vontade dançando como os campeões apesar de, há muitos
anos, ter chegado a me apresentar com características próximas ao
padrão “escenario”. Confesso que, por esse motivo, muitas vezes, já
recusei convites para me apresentar em certos eventos particulares ou
profissionais pensando ser a minha interpretação para um show de tango
incompatível com as expectativas da plateia ou do contratante.
O
processo de aumento do índice de sensação de tango de sua dança vem de
dentro para fora mediante muito estudo, aulas, prática e experiência.
Toda vez que pensamos ao contrário disso nos voltamos contra nós
mesmos, aprisionando-nos a estereótipos e limitando tão vasta e profunda
cultura artística.
Muitos de nós já sentimos algo
parecido com o que Angêla sentiu naquele momento e, por experiência,
digo que se você já se sentiu assim esta começando a distinguir o que é
um bom show de tango e, portanto, tem tudo para dançá-lo bem!