Eu não sou um exímio dançarino, confesso. Aliás, sejamos honestos,
não sei mesmo dançar. Sou um fiasco. Mas me esforço e, acima de tudo,
reconheço que saber dançar é requisito básico para conquistar uma boa
mulher.
A conversa aqui, é claro, é de homem para homem – e me refiro,
obviamente, às mulheres. Não é papo de menininho atrás de menininhas.
Homens-homens precisam saber dançar caso queiram conquistar de verdade
mulheres-mulheres. Fato. Sigamos.
Há uma corrente, certo viés de homossexualidade recalcada, segundo a qual “Homem que é homem não dança”.
Bobagem. Quem não dança, segura criança e, bom, homem que é homem
segura criança? Eu, não. Espero que você também não. Você, macho como
eu, enlaça a mulher e sai pelo salão mostrando a que veio. Deixa os
“machões” fazendo as tais piadinhas entre si (eles sempre ficam
juntinhos, já reparou?), paradões, enquanto você e outros igualmente
espertos faturam a mulherada. E, pode apostar, nas vezes em que ele está
com alguma mulher, a garota do cara – isso é sério! – não pára de
pensar em você.
Porque desde que o samba é samba e o mundo é mundo a dança faz parte
do jogo sensual de tudo quanto é espécie, inclusive a humana. Não é
preciso ser formado em antropologia para saber da importância da dança
na sedução e na conquista. E também não é preciso ser o Carlinhos de
Jesus para ter a real noção do quanto há de sensual nos passos trocados
com uma garota numa pista, num salão, ou onde quer que seja, desde que
sob a música adequada.
Mas, como ia dizendo, sou um péssimo dançarino. Esforçado, sem
dúvida, mas péssimo. Por isso, trago a vocês uma entrevista com Gustavo
Gitti.
1. Você dança há quanto tempo? E em quanto tempo um cara que não sabe dançar pode ter a manha de conseguir fazer algo minimamente aceitável em público?
Até os 23 anos, eu não sabia nem o básico do forró. Tinha feito umas 3
aulas gratuitas no SESC ao lado de minha ex-namorada e em todas elas
saí frustrado, fraco e com sensação de impotência: outros caras a
conduziam de um jeito que eu não sabia, a faziam girar, sorrir, e eu…
nada.
Eu comecei a fazer aula no início de 2006. Meses depois, consegui uma
bolsa e tive a sorte de fazer 3 noites de aulas por semana, como
cavalheiro nas turmas que tinham mais mulheres que homens (quase todas).
Participei de aulas especiais e tive a oportunidade de conhecer quase
todos os ritmos da dança de salão, focando mais em salsa, samba de
gafieira e tango.
Com 4 aulas de um ritmo específico, qualquer homem já pode sair para
dançar e se arriscar a estender a mão para algumas mulheres. O forró,
por exemplo, se aprende mais na noite do que em uma academia. Os outros
ritmos já são mais complicados, mas sempre aprendemos muito observando
caras experientes no salão.
2. Vou direto à tal perguntinha espinhosa: e esse negócio de que “dançar é coisa de viado”? O que tem a dizer sobre os que falam isso?
Em mais de 2 anos frequentando academia, casas e bailes, eu encontrei
apenas um homossexual. Na dança de salão, a polaridade
masculino/feminino é extremamente enfatizada. Nas aulas, os homens são
ensinados a conduzir, a ter pegada. E as mulheres são instruídas a serem
conduzidas, a se deixarem levar, se entregar. Alguns gays talvez se
sintam desconfortáveis ao tentar incorporar sua energia masculina e
pegar com vigor e firmeza o corpo de uma mulher, mas nunca conversei
sobre isso, nunca testei essa hipótese.
Quando comecei a dançar, muitos de meus amigos brincavam: “Vai pro
balé hoje?”. O curioso é que isso parou, de repente, após uma festa
comum em que estávamos todos juntos, daquelas em que ninguém dança a
dois e as músicas são de todos os tipos. Aproveitei todas as músicas que
tinham um ritmo parecido com forró ou samba e tirei várias mulheres
para dançar. Resultado: mal conversei com eles a noite inteira, afinal
era um homem para mais de 20 mulheres. Depois, dois deles me pediram
aulas particulares. Pena que meu código de ética só permite aulas
particulares para mulheres.
3. Existem festas específicas para dançar, com gente bonita tal e coisa, ou é preciso freqüentar os famigerados “Bailes da Saudade”?
A dança de salão está muito “jovem” atualmente. Não só há festas
específicas e grandes bailes das academias, como exitem cada vez mais
“baladas” feitas para dançar a dois. Salsa, zouk, samba-rock e forró são
os ritmos da noite paulistana. Tango tem seus poucos lugares, como o
Tanguetto no Itaim ou o Café Piu Piu nos últimos domingos do mês (com
show do melhor grupo brasileiro de tango, De Puro Guapos).
Entre os locais para se dançar, indico os shows da Banda Glória
(geralmente na Aldeia Turiassu, para dançar forró e gafieira), o Rey
Castro às quartas (salsa ao vivo), o Azucar (salsa), o Buena Vista às
terças (salsa) e aos domingo (zouk), e o Teatro Mars, DiQuinta e Grazi a
Dio (samba-rock). Também já peguei excelentes shows de gafieira, salsa e
forró na Choperia do SESC Pompeia, o melhor local de São Paulo para
realmente dançar.
4. Como você vê o resgate da “música dançante” (a dois) de uns tempos para cá, como o samba-rock, o samba-de-gafieira e outras variações?
Tempos atrás, eu assisti a um documentário sobre um projeto americano
que promovia aulas de dança de salão (vários ritmos) em escolas
públicas, com crianças de 11 a 12 anos. Achei aquilo excelente! É claro
que eles tiveram a péssima idéia de fazer um concurso e distribuir
troféus ao fim, mas isso é o de menos. Durante as aulas, os meninos
aprendiam que ser homem envolve ter direcionamento, sensibilidade e
respeito, não só com mulheres, mas na vida em geral. E as meninas, sem
saber, resgatavam sua essência feminina, tão rara de se ver atualmente,
de delicadeza, encanto, radiância e entrega.
Creio que tais ensinamentos da dança de salão, por serem aprendidos
com o corpo (não de modo teórico), fazem com que ela seja cada vez mais
valorizada neste mundo contemporâneo que dissocia mente e corpo e gera
avatares, indivíduos puramente mentais, desconectados, sem presença. A
dança aumenta nossa consciência corporal, nossa sensação de ser um corpo
– em vez de ter um corpo.
5. As mulheres preferem os homens que sabem dançar ou isso não faz diferença?
Nunca conheci uma mulher que não gostasse de dançar, ser conduzida e
se divertir no jogo dos corpos em meio a uma boa música. É claro que a
dança não é pré-requisito para que a relação seja maravilhosa, mas ela
certamente eleva os níveis de qualquer relação maravilhosa. Se um casal
passa por dificuldades, a dança é uma excelente terapia –
não-discursiva, intensa e objetiva. E se um casal passa por seus
melhores momentos, nada melhor do que expressar toda essa energia na
dança, um modo de se conectar com o outro que fica entre a conversa e o
sexo, mas que amplia o sexo e a conversa, entende?
Tive o prazer de conhecer vários casais, de diversas idades, que
mudaram completamente a relação com a prática da dança de salão. E pude
comprovar isso na minha própria vida: nunca mais olhei para uma mulher
com as perspectivas limitadas de antes. É uma delícia estar em um festa e
poder convidar absolutamente qualquer mulher para fazê-la sorrir, para
colar no seu corpo, para curtir a música de um jeito vivo. A única
mulher que rejeitou um convite meu (algo raríssimo na dança de salão em
geral, as mulheres nunca recusam um convite) foi a atriz global Gisele
Itié. Mesmo aquelas que não sabem dançar, todas aceitam aprender, basta
pedir com jeito.
Na comunidade online que coordeno (exclusiva para homens), sempre
recomendo a dança de salão. Sou até chato, mas já contamos com inúmeros
relatos de noitadas inesquecíveis que só foram possíveis depois de
algumas aulinhas.
6. Então é isso que irrita tanto os que não sabem dançar? Por isso eles ficam bravinhos?
Seria ótimo se um pesquisador pudesse levar adiante tal hipótese:
será que homens que não dançam sentem mais raiva e inveja? Eu suponho
que não, afinal tenho muita inveja e raiva também, mesmo dançando
direto.
Mas a preferência das mulheres por um homem que dança deve irritar
muita gente sim. Eu mesmo ficava nervoso sempre que tocava forró e eu
era confrontado com minha impotência e incapacidade de levar minha
parceira a um orgasmo dançante, público, só com giros, conduções e
pegadas. Impedi-la de dançar com outro era uma opção covarde, deixá-la
dançar sob meus olhos era sofrimento demais… Enfim, não me restou outra
alternativa a não ser virar homem e me tornar capaz de oferecer aquilo
que uma mulher tanto deseja: se sentir mulher. Às vezes um homem só faz
isso na cama. Nestes casos, a dança de salão, não tenho dúvidas, ajuda a
manter essa postura na vida, em cada gesto, em cada olhar.
7. Por fim, se esqueci de algo, deixe algumas dicas para nós, que somos uns pés-de-chumbo mas não queremos perder mais essa possibilidade de conquistar algumas donzelas…
Acho que o primeiro passo é admitir que não dançar é uma fraqueza,
não motivo de orgulho. Depois disso, lembrar que podemos passar a vida
toda sem aproveitar alguns mundos deliciosos, sem experimentar toques
diferentes, sem viver boa parte das possibilidades da vida. E então, ao
olhar para uma mulher, podemos perceber que além de falar com ela,
tocá-la, fazer amor, além disso tudo, podemos… dançar com ela! Se um
homem tiver tal percepção, matricular-se num curso de dança de salão
será inevitável.
O segredo para uma boa dança, mesmo sem saber muitos passos, é pegar a
dama corretamente: o braço direito deve tocar toda a extensão das
costas dela e sua mão deve chegar até quase o início dos seios, perto da
axila, ou seja, realmente agarrá-la com o braço direito, que será seu
lado “machão”. A mão esquerda, seu lado “sensível”, vai brincar com
diferentes toques e alturas, vai dizer coisas com os dedos, puxar para
perto do seu peito em um bolero, para sua cintura em um forró, para
longe em um merengue. Isso já faz toda a diferença, mesmo se você não
fizer nada sofisticado.
Quanto ao passos, use e abuse do básico, ande com ela de um lado a
outro, como se fossem um só. A sensação de entrega e alegria não depende
de passos acrobáticos, mas de sua postura, energia, e do modo como você
a conduz.
Outros pontos importantes: beba pouco (eu geralmente tomo uma
margarita ou uns 2 chopps antes e depois só água), passe pouco perfume,
não se importe em suar muito, respire-a profundamente durante a dança
(como se fosse sugá-la), olhe-a nos olhos durantes os giros, peito
aberto, ombros para trás, realmente encoste seu corpo inteiro no dela e
sinta-a inteira, agradeça ao fim de cada música e não use a dança para
tentar pegar na bunda, nos peitos ou arrancar um beijo porque isso é
coisa de adolescente.
Sério, não tente beijá-la, não use a dança com esse propósito. Uma
mulher sabe quando você está dançando e quando você está só querendo
comê-la. Eu gosto do pensamento zen para resolver isso: durante a dança,
dance; durante o sexo, trepe.
Vá por mim: em vez de tentar um beijo, deixe que ela não consiga
evitá-lo. Dance muito, sem ser refém de suas segundas intenções, e
apenas fique bem perto dela. Se houver desejo mútuo, o beijo será
inevitável, não se preocupe. Da dança ao sexo, é um pulo, pois está tudo
acontecendo já: você conduzindo, ela se abrindo, ambos sorrindo e
suando…
Lembre-se que a dança não é apenas um modo de conquista masculina,
mas um espaço para que a mulher expresse seu desejo de um modo que ela
não conseguiria em uma mesa de bar. É também uma forma de sedução
feminina, então relaxe como sendo presa dela também. Quando ambos caçam,
a coisa fica ainda mais divertida! Animais que somos, queremos mesmo é
nos cheirar e nos movimentar juntos. Para fazer isso no sexo, você
precisa de certas preliminares e não consegue com qualquer pessoa.
Agora, para fazer isso na dança, basta estender a mão em qualquer
direção. ;-)
Para aqueles que desejam encontrar uma academia de dança de salão em
SP, fico à disposição para indicar algumas. Basta deixar um comentário
aqui. Agradeço pela entrevista, foi um prazer. Abraço e boa dança a
todos!
* Entrevista originalmente publicada em 2008 no extinto blog do Isaías Camanducaia.
http://papodehomem.com.br/danca-de-salao-o-jogo-sujo-dos-relacionamentos/